(As avós, Doris Lessing: tradução de Beth Vieira. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. 104 p.)
“De ambos os lados de um pequeno
promontório, pontilhado por cafés e restaurantes, havia um mar brincalhão porém
digno, bem diferente do verdadeiro oceano que rugia e roncava do outro lado da
bocejante baía cercada por rochas que todos chamavam – até nos mapas tinha este
nome – de Dentes de Baxter.”
É nesse cenário paradisíaco que
duas meninas novatas na escola se tornam grandes amigas. Uma amizade capaz de
afetar gerações de duas famílias construídas sob um único alicerce. Lil (ou
Liliane) é a mais delicada, de feições sublimes enquanto Roz (ou Rozeanne)
esbanja um corpo mais maduro com uma visão irônica de tudo; se completam como
gêmeas. Crescem juntas e seus
atritos são marcados por suas diferenças físicas e com o passar do tempo a
relação parece girar em torno de um “determinismo”, tudo que acontece a uma
necessariamente vai acontecer à outra.
Nas relações amorosas
insatisfatórias, diante das constantes investidas ciumentas dos maridos, trazem
novos ares na amizade. Os filhos são quase o espelho das mães, desbravam o mar
como as pequenas fizeram anos atrás. A família, então, fica subordinada a Lil e
Roz, são elas a base afetiva psicológica para enfrentar os percalços da
separação e da perda. O que seria natural torna-se desconcertante.
Ian, filho de Lil, encontra
conforto, diante da morte do pai, em Roz. Tom, contrário ao relacionamento do
amigo com a mãe, procura os carinhos de Liliane. O absurdo foge aos desejos
sexuais de ambas amigas que precisam viver sob segredo na comunidade local.
O espaço de tempo transcende as
principais marcas da vivência de Roz e Lil. No épico, temo-las como heroínas,
capazes de solucionar os atos que ameaçam a ordem estabelecida. Às demais
narrativas podemos efetivar as imagens globais do texto e rememorar tudo que
além do cenário paradisíaco desestruturam o ambiente.
As mulheres de Lessing em “As
avós” são mulheres que conquistaram a liberdade de pensamento e expressão. A
união dessas garotas é o ponto crucial no desenrolar de suas vidas, se entendem
como ninguém mais. As relações com os filhos é resultado do carinho cultuado
entre elas.
O breve romance de Doris Lessing
entrega ao seu leitor um turbilhão de sentimentos que rompem com os todos os
“dogmas” da literatura. Aqui os conceitos de amizade, família, amor transpassa
o aceitável para, ainda sim, torna-se possível. A leitura é fluida em um enredo
que busca desenvolver-se nos fatos, principalmente por buscar o cerne das
questões abordadas.
Diante de todas as reviravoltas,
seria o “mar brincalhão” nosso principal personagem?
Muito boa!! As avós é super recomendável.
ResponderExcluirShely