Por R.S.Merces
“Não havíamos percebido que
aquilo que o público realmente abomina na homossexualidade não é a coisa em si,
mas o fato de ser obrigado a pensar nela.”, assim escreve E. M. Forster nas
notas finais de seu romance, “Maurice”. A frase vem seguida de “Maurice talvez
escape”.
O livro escrito estre os
anos de 1913 e 1914 permaneceu guardado até sua publicação em 1971. O tema
homossexualidade era ainda restrito na literatura e podemos apontar o início do
modernismo como grande difusor de um novo pensamento sobre o homem. Publicações
como “O quarto de Jacob” de Virginia Woolf e “Ulysses” de James Joyce,
apresentam o amor de um jovem por seu amigo e uma androginia masculina,
respectivamente. Contudo somente depois dos anos 60, movimentos de grupos
homossexuais possibilitam a leitura do amor não estereotipado de Forster.
Maurice é um homem “comum”, “desajeitado”,
sem nenhuma caracterização, o que o deixa até mesmo desorientado no
reconhecimento de seu amor por Clive, um intelectual que busca nos
conhecimentos gregos sua identidade. Contrariando a tradição, existe aqui um
final feliz, o que torna o enredo quase impossível à sociedade tradicional da
época em que foi escrito.
Se o século XX trouxe um
grande avanço quanto ao reconhecimento do amor de um homem por outro homem,
infelizmente somos, diariamente, confortados por pensamentos arcaicos
principalmente por ideologias religiosas. As palavras de Forster escritas em setembro
de 1960 são tão atuais quanto seu romance.
Acompanhamos nos últimos dias
as agressões virtuais sofridas pela escritora Lilian Farias na divulgação de
seu novo romance “Mulheres que não sabem chorar”. Por enquanto só tivemos a
publicação da sinopse do livro e de seu referido tema, a homossexualidade
feminina. Contudo as poucas palavras já causaram desconforto na internet e a
autora tem recebido mensagens de ódio e comentários ofensivos tanto ao texto
quanto à sua vida pessoal.
É comum que escritores sejam
constantemente confundidos com suas narrativas, criando neles a personificação
da verdade falha no texto. Esses limites, não reconhecíveis, no trabalho de
Lilian Farias demonstra o quanto ainda vivemos em uma sociedade que não quer
pensar na possibilidade de um verdadeiro amor entre pessoas do mesmo sexo.
As redes sociais hoje em sua
grande abrangência de usuários comportam infinitas representações de ideologias
marcantes do século XXI. E é essa liberdade que torna esse livro possível mesmo
com as diversas denúncias contra a página de divulgação.
“Mulheres que não sabem chorar”
não ficará guardado em uma gaveta por 56 anos e ainda esse ano os leitores
poderão conferir o romance dessas duas “ainda misteriosas” personagens.
E aos preconceituosos
de plantão, lembrem-se de que ninguém precisa de salvação, precisamos é de
A.M.O.R. Lembrem-se de que a resistência criou a guerra e a guerra dizimou milhões
de pessoas. Lembrem-se de que não são obrigados a ler nada que não quiserem
ler. Lembrem-se de que somos humanos, somente ISSO.
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